terça-feira, 15 de outubro de 2013

Quem Somos e Como Chegamos Aqui – III – A vida na Idade da Pedra





Como nos comportávamos e pensávamos? Nós nem nos apercebemos nem temos consciência disso, mas a maior parte do nosso tempo neste planeta fomos recolectores e caçadores e vivemos a maior parte do tempo em grandes comunidades, em liberdade e muito distantes de termos os códigos morais que nos regem actualmente. Assim, apesar de tudo o que aprendemos culturalmente e das regras morais e legais que a sociedade nos impõe, subconscientemente, ainda estamos na idade da pedra (psicologia evolutiva).

Hábitos Alimentares – Praga da Obesidade
No passado, se encontrássemos algo doce por onde quer que andássemos em busca de alimento, racionalmente comeríamos tudo de uma vez porque a comida era escassa e porque não poderíamos dar-nos ao luxo de deixar para outro dia pois correríamos o risco muito forte de já lá não encontrarmos nada. Hoje o nosso ADN diz-nos exactamente a mesma coisa que nesse passado remoto, ou seja, que devemos comer o máximo que podemos para sobreviver. Nós evoluímos muito mais rápido que o nosso ADN, que nos considera como se estivéssemos na Savana, e por isso temos esse comportamento natural. 

Vida Sexual e Relações Familiares
As pessoas viviam em comunidades e não tinham relações monogâmicas: mulheres e homens tinham relações sexuais e encontros “românticos” com vários homens e várias mulheres — relações heterossexuais e homossexuais. Não existia, claro está, qualquer conceito de casamento para toda a vida e família nuclear.
Todavia isto não quer dizer que as relações fossem consideradas “noitadas” ou relações promiscuas, com uns e com outros, pois dentro da tribo todos se conheciam muito bem ao ponto de se poder dizer que se conheciam melhor do que muitos casais dos dias de hoje, até porque passavam a maior parte do tempo juntos cuidando-se uns dos outros, algo que a maior parte dos casais de hoje não se podem dar ao luxo.
As crianças não eram criadas pelo casal, mas pela tribo, até porque nunca se sabia quem seria o pai. As mulheres, no seu melhor entendimento, queriam acasalar com vários homens da tribo para que os seus filhos colhessem as melhores características de cada parceiro.

Se esta teoria se verifica verdadeira está fácil de entender os imensos problemas amorosos das nossas culturas — fomos biologicamente preparados para viver de uma maneira que entra em conflito com as normas morais e até legais das nossas sociedades modernas.

Mas como a nossa linguagem se volveu ficcional cada tribo construiu a sua história particular e torna-se difícil, assim, podermos afirmar com total segurança qual é o nosso comportamento natural porque algo que é tabu para uma tribo pode ser normal para outra.


A grande maioria dos humanos vivia em pequenos bandos sem a presença de qualquer animal com a excepção de cães. Estes foram os primeiros animais domesticados pelos humanos — uma versão mais dócil do lobo que foi apurado para protecção da nossa espécie, seja como sistema de alarme contra perigos, seja para ajuda na caça, ou mesmo como protecção. Uma característica que facilmente distingue um lobo de um cão é o facto de uns ladrarem e outros praticamente não o fazerem. O homem dedicou-se a apurar esta característica para sua conveniência. Com o tempo a relação do homem com o cão tornou-se tão importante que ainda hoje dizemos que é o nosso melhor amigo.

Tanto a solidão como a existência de uma vida privada eram situações raras naqueles tempos; havia algumas lutas entre tribos mas a cooperação é algo que se pensa ter sido mais comum:
  •        Trocas comerciais
  •        Intercâmbio de elementos das tribos
  •        Celebrações religiosas comuns
  •        Alianças contra outras tribos


Viviam em um território particular mas não no mesmo local pois consoante a estação do ano teriam que buscar alimento em locais diferentes. Em casos excepcionais alguns bandos fixar-se-iam em determinados locais por meses e às vezes até poderia chegar a um ano. Nas zonas costeiras, junto ao mar, rios, lagos e oceanos, poder-se-ia encontrar acampamentos permanentes bem antes da Revolução Agrícola.
Estas vilas piscatórias surgiram há 45 mil anos atrás nas ilhas da Indonésia e foram a base para a invasão da Austrália pela nossa espécie.
Tínhamos uma dieta variadíssima e comíamos coisas como insectos, raízes, tartarugas, sapos, cervos, mamutes etc. Neste período a economia recolectora era a mais importante para a maioria dos bandos e a sobrevivência dependia da nossa forma física e mental que tinha que ser apuradíssima. Individualmente estes humanos sabiam muito mais coisas do que um indivíduo nos dias de hoje e há até evidências que o tamanho dos nossos cérebros tem vindo a diminuir desde a Revolução Agrícola.



Estes recolectores, podemos afirmar, em muitos domínios tinham melhor vida do que nós nos nossos tempos, senão vejamos:


Países Desenvolvidos
Em Desenvolvimento
Recolectores
Horário de Trabalho
40-45 hrs/semana
50-80 hrs/semana
35-45 hrs/semana
Trabalho em Casa
Sim
Sim
Não


Trabalhador Comum Actual
Recolector
Sai de casa às 7 da manhã
Deixa o acampamento às 8 da manhã
Às 8 da manhã chega ao trabalho
Procura comida com os amigos
Trabalha na mesma máquina durante 10 hrs
Às 3 da tarde regressa ao acampamento
Leva uma hora a regressar a casa
Come e murmura com os amigos
Faz o jantar, lava os pratos, cuida da casa
Faz o que quer

Concluímos, pois, que estes recolectores tinham uma vida muito mais interessante e muito melhor alimentação do que os Sapiens pós Revolução Agrícola.

Por que razão tinham os recolectores melhor dieta do que os camponeses?
Porque os recolectores tinham acesso a uma variedade enorme de comida, enquanto, os camponeses passaram a depender apenas de uma colheita em concreto, ou por vezes de uma outra, o que não é de todo bom para a nossa saúde. Além do mais a dependência de uma determinada colheita coloca em risco de fome toda a tribo se algo de terrível acontece à colheita. A esperança média de vida era praticamente igual e situava-se entre os 30 e 40 anos, mas devia-se à enorme taxa de mortalidade infantil, no entanto, nas sociedades recolectoras, se se conseguisse atingir a idade de 20 anos era muito provável e bastante frequente alcançar-se os 60, 70 e até 80 anos.
Com a Revolução Agrícola muitos animais passaram a viver com os humanos em vilas e cidades em condições de higiene praticamente inexistentes e surgiram doenças infecciosas, derivadas dos animais. que dizimaram populações inteiras. As sociedades recolectoras continuavam saudáveis, mais livres e por conseguinte mais felizes.

Vida espiritual
Antes da Revolução Agrícola os Sapiens tinham crenças animistas, entidades com quem podiam comunicar directamente, como as rochas, montanhas, rios, árvores, coisas materiais como estas atrás referidas, assim como imateriais tais como fadas e demónios. Acreditavam que tudo possuía uma alma, um espírito. Os humanos podiam fazer todo tipo de tratados com estas entidades físicas enquanto os xamãs tinham o poder interceder sobre os espíritos. Não havia hierarquias, nem deuses poderosos, portanto todos tinham o mesmo estatuto. Não se pode falar numa religião específica mas apenas num nome que cobre uma vastidão de crenças — Animismo.
Com a Revolução Agrícola começam a aparecer os “grandes deuses” e passam a ser a forma de religião mais comum entre os sapiens. Sem embargo as diferenças entre estas religiões dos “grandes deuses” não seriam menores do que as diferenças entre as crenças animistas.

Política e Actividade Guerreira

Não dispomos ainda de muitas evidências sobre como se organizavam politicamente mas foi encontrado em Sungir, Rússia, a tumba de 3 indivíduos — 1 maior e 2 menores — que ostentavam uma riqueza acima da média.
Existem 3 teorias para esta descoberta:
  1.   Uma vez que as crianças eram demasiado pequenas para terem provado algo de especial, deviam o seu estatuto aos seus pais 
  2. Tinham sido identificadas como a reencarnação de um velho espírito
  3. Foram sacrificadas num ritual.


Isto prova que há 30 mil anos a nossa espécie já podia inventar códigos político-sociais que iam para além dos ditames do nosso ADN e dos padrões comportamentais de outros animais. Evidencia igualmente desigualdade social e hierarquias pelo menos em alguns bandos.

Quanto à guerra há várias teorias: uns afirmam que antes da Revolução Agrícola não havia muito por que lutar. Outros afirmam que sempre foi muito violento devido à nossa intolerância intrínseca com a diferença. A verdade é que não há evidências que provem violência em grande escala no período pré-Revolução Agrícola, mas uma vez que somos capazes de construir realidades como bem entendemos, é bem possível que algumas tribos tenham arquitectado as suas sociedades em torno da violência e outras em torno de formas de vida mais pacíficas.

  

Sem comentários:

Enviar um comentário